Foto do filme O Sol de Inverno. Crédito: Divulgação / Michiko Filmes

O sol de inverno

As prerrogativas da arte e por que não podemos calar

O filme Sol de Inverno (2024) me manteve concentrada todo tempo, de verdade. Integrando a seleção Un Certain Regard, do Festival de Cannes, o longa do diretor japonês Hiroshi Okuyama fez sua estreia mundial em maio do ano passado e, desde então, por onde passa coleciona elogios da crítica, incluindo os tradicionais festivais de Toronto, San Sebastián e a Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

Logo, quem sou eu na fila do cinema para dar opinião? Posso dizer que o filme é sensível e delicado, com um ritmo que vai evoluindo, com uma fotografia que se conecta com a temperatura da narrativa e retratando uma linda história de amizade.

Foto do filme O Sol de Inverno. Imagens Divulgação / Michiko Filmes
Foto do filme O Sol de Inverno. Imagens Divulgação / Michiko Filmes

MAS… porém, todavia, contudo, e pode ser injusto dizer isso, sobretudo porque não sou especialista, não gostei. Explico.

Cheia de doçura e delicadeza, a narrativa traz a emocionante história de Takuya (Keitatsu Koshiyama), de 9 anos. Partindo de uma admiração genuína pela patinação, com a qual ele convive vendo a colega Sakura (Kiara Takanashi) ensaiar, a história chega ao ápice mostrando a linda relação que surge entre os pequenos e o treinador Hisashi Arakawa (Sôsuke Ikematsu). E por inúmeras vezes as cenas são apenas isso: amor, puro e simples – e é lindo.

Ex-campeão da patinação artística, Arakawa decide acolher o sonho do menino e treiná-lo como parceiro da menina. Mais do que ensiná-los, a atitude do professor faz o desabrochar dos três personagens e desenvolve um laço profundo entre eles.

Ou seja, a partir de uma premissa simples, o cineasta japonês expõe sentimentos profundos, revelando a autêntica beleza da espontaneidade nas conexões humanas. E como já disse, o filme traz cenas tocantes.

Foto do filme O Sol de Inverno. Imagens Divulgação / Michiko Filmes
Foto do filme O Sol de Inverno. Imagens Divulgação / Michiko Filmes

Mas o longa tem uma guinada decepcionante – como a própria natureza das emoções, julgamentos e atitudes que retrata.

ATENÇÃO: Contém Spoilers!

Quando Sakura descobre que o técnico Arakawa é homossexual, e daí decorrem uma série de desencantamentos, rupturas e muita tristeza, a produção peca em não dizer nada.

Não sabemos qual é a perspectiva a partir da qual a história é contada, ela apenas acontece. E tudo bem, a vida acontece.

Também talvez não seja o papel do cinema julgar. Ele pode, sim, só mostrar.

Mas acho que o tanto que a arte deve incomodar, ela deve se posicionar. Porque ela pode ter essa prerrogativa.

Só que não é o que acontece em Sol de Inverno, quando nos despedimos de uma linda relação construída com muito afeto sem nenhuma explicação. Cada um vai para um lado, é como se a amizade derretesse como o lago gelado no qual a dupla patinava, que, com a chegada do verão, se desfaz.

Isso torna o filme ruim? Não. Mas me decepcionei. Ninguém luta, todos desistem e vai cada um pro lado.

Foto do filme O Sol de Inverno. Imagens Divulgação / Michiko Filmes
Foto do filme O Sol de Inverno. Imagens Divulgação / Michiko Filmes

Tudo bem que relações amornam, esfriam, acabam. Mas não está tudo bem em calar quando temos que gritar; tampouco magoar, afastar e desrespeitar, quando temos que acolher. Isso é inadmissível.

Somos todos iguais. Isso é inegociável.

Pôster do filme O Sol de Inverno. Imagens Divulgação / Michiko Filmes

Informações básicas

Sobre: Em uma ilha japonesa onde as estações do ano moldam a vida cotidiana, Takuya, um jovem introspectivo, se vê envolvido no mundo da patinação artística ao ser convidado por Arakawa, um ex-campeão do esporte, para formar uma dupla com a talentosa Sakura. À medida que treinam juntos, sentimentos profundos começam a surgir, desafiando suas emoções e o entendimento do que significa crescer e se conectar com o outro.
Nome original: Boku no Ohisama (僕のおひさま)
Ano: 2024
Direção: Hiroshi Okuyama
Roteiro: Hiroshi Okuyama
Elenco Principal: Keitatsu Koshiyama, Kiara Takanashi, Sôsuke Ikematsu, Ryuya Wakaba, Maho Yamada
Nacionalidade: Japão / França
Gêneros: Drama, Esporte, Romance
Duração: 100 minutos
Link para o IMDb: https://www.imdb.com/title/tt22694908/
Trailer: https://youtu.be/WYMeTGzZLxo

Sobre Hiroshi Okuyama

Foto do diretor Hiroshi Okuyama. Crédito: Divulgação / Michiko Filmes
Foto do diretor Hiroshi Okuyama. Crédito: Divulgação / Michiko Filmes

Sol de Inverno é o segundo longa-metragem de Hiroshi Okuyama, que nasceu em Tóquio, em 1996. Seu primeiro filme, Jesus, de 2018, estreou no Festival de San Sebastián, na Espanha, onde ganhou o prêmio principal na seção Novos Diretores. Okuyama tinha 20 anos.

Além de dirigir, ele escreve seus roteiros, edita e faz a câmera de seus trabalhos. Jesus venceu os prêmios de melhor fotografia em festivais de Estocolmo, na Suécia, e Dublin, na Irlanda.

Entre seus dois longas, Okuyama dirigiu os nove episódios de uma minissérie para TV, Makanai: Cozinhando para A Casa Maiko. Mas sua estreia mesmo foi bem antes disso tudo: em 2009, com apenas 13 anos, ele dirigiu o videoclipe Graduationparty!!!!!, que estreou no Festival Internacional de Cinema de Kyoto.

Sobre a Michiko Filmes

Sol de Inverno é o primeiro lançamento da Michiko Filmes, distribuidora comandada por Michel Simões e Chico Fireman, amigos que se conheceram por causa do amor pelo cinema e que, durante 7 anos, integraram a equipe do Cinema na Varanda, um dos primeiros podcasts de cinema do país.

Imagens: Divulgação / Michiko Filmes

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